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Biblioteca da Cidade

Resenhas críticas de obras que ajudam a pensar a cidade enquanto objeto de estudo multidisciplinar, passando por referências bibliográficas em filosofia, história, sociologia e urbanismo.

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O direito à cidade - Henri Lefebvre

  • Foto do escritor: Amanda Freire
    Amanda Freire
  • 1 de set. de 2018
  • 4 min de leitura

Atualizado: 13 de out. de 2018


Antes de qualquer coisa preciso dizer que esse não é um texto científico escrito com a objetividade de uma tese de doutorado. Foi fruto apenas dos devaneios de uma pessoa “pijamada” (vestida com roupa velha e algumas descosturas), e claramente cheia de neologismos. Vamos começar com a ilusão biográfica de que a vida de um sujeito é linear, coerente e orientada (nascer, reproduzir e morrer), portanto começaremos com o nome do autor (primeira coisa que recebemos até antes de nascer), sua obra (quase um filho ou até mais importante) e depois a crítica que receberá.


Henri Lefebvre (1901-1991) foi um filósofo e sociólogo francês pouco compreendido e aceito no início do século XX. Eu diria que isso aconteceu porque esse autor trazia uma discussão ousada que rompia, pelo menos em alguns aspectos, com o marxismo ortodoxo: a grande moda entre as correntes sociológicas da época. Ouso dizer, no entanto, que ele foi um ferrenho marxista, pouco compreendido, que embarcou no aquecido debate sobre a crise do capitalismo no mundo ocidental pós revolução industrial.


Busquei compreender o motivo da estranheza dos marxistas da época em relação às afirmações de Lefebvre, e talvez eu possa conseguir esmiuçar o embaralhamento. Primeiro é preciso saber que os estudiosos daquele período buscavam desvendar as mazelas da sociedade através de conceitos como lutas de classes e a relação entre a exploração da força de trabalho e as indústrias (claro que tem milhões de páginas nos densos e pesados livros segundo o método do materialismo histórico). Mas o que quero dizer é que Lefebvre trazia algo novo. Ele não desdenhou da encorpada enciclopédia marxista, mas na verdade afirmou que tantas discussões ainda não eram suficientes para entender a sociedade em sua complexidade. Foi então que ele resolveu lançar um elemento novo! tão complexo quanto os conflitos da sociedade moderna! tão revelador quanto o oráculo de delfos! tão contraditório quanto esse texto que vos escrevo! tão absurdamente intrigante quanto as disputas sociais! e tão segregador quanto o apartheid na África! … Eis A CIDADE, ou melhor ainda (porque o autor é cheio de frescuras importantes), o URBANO.


A primeira palavra difícil que aprendi no âmbito das ciências que se propunham serem humanas foi, sem dúvida, “epistemologia”. Que danado poderia ser? Me espantei quando, ao ler tamanha espécie de palavra, não conseguia compreender o motivo pelo qual Lefebvre falava sobre o Urbanismo enquanto um campo de saber que pensava a cidade à luz das suas próprias concepções. Acho que a dificuldade veio do fato de não haver um único sujeito que falasse, mas uma ciência eleita por diferentes sujeitos e instituições como legítima, e essa ciência (o urbanismo) cria seus próprios discursos, objetos e problemas de estudo (depois vou ter a ousadia de falar um pouco mais sobre Foucault como nessa tímida passagem, mas preciso tomar uma dose de coragem para isso). A questão que Lefebvre colocava era sobre como o próprio urbanismo seleciona as problemáticas das cidades: aquilo que cientificamente vai valer a pena ser discutido.


Essa foi a primeira chave para entrar no mundo dos conceitos, das teorias e das ideologias sobre o qual esse autor, tão exaustivamente poético e erudito, falava. Por esse motivo, optei por selecionar apenas algumas questões da sua obra, suficientes para o leitor perceber o quanto Lefevbre estava insatisfeito com a modernidade, diria até que nostálgico, pois quando se refere à cidade antiga ele fala no culto à arte, a cidade como uma obra, a cidade prodigiosa e o quanto ela está sendo cada vez mais destruída pelos valores mercadológicos e capitalistas. Falar na reforma de haussmann (1852) em Paris, por exemplo, deveria provocar a mais profunda e íntima indignação de Lefebvre.


A primeira grande crítica que Lefebvre faz ao urbanismo é direcionada aos tecnicistas. Ora, essa preocupação com as formas das cidades, o design, o desenho, tinham, para Lefebvre, muito a ver com um processo de racionalização do espaço que mata o sujeito e sua ação e que, ao mesmo tempo, transforma a cidade em produto de uma lógica que é cartesiana, e que propõe dar coerência às práticas reformistas do urbano. Isso porque o autor tinha uma concepção de espaço diferente. Ele se preocupava com o espaço no âmbito do vivido, do que ele chama de prático-sensível, do espaço habitado, ou seja, a tese de que há uma produção social do espaço, e é essa que mais interessa.


Le droit à la ville, publicada em 1968, criou o termo “direito à cidade”. Inicialmente a discussão estava concentrada na questão do direito à moradia, mas nos dias de hoje outros direitos como o direito à mobilidade urbana, ao lazer, à memória, dentre vários outros direitos, têm encontrado cada vez mais espaço nas pautas políticas da cidade. Como um Humanista, Lefebvre defendia a ideia do homem livre para escolher seu destino e acreditava numa “Revolução Urbana”, o que vai dar nome a outra obra de sua autoria. Era um defensor da dignidade humana num momento em que pouco se falava sobre direitos humanos na cidade. No mais e por hora, Lefebvre foi criticado por fazer afirmações sempre pouco factíveis, abstratas e utópicas, mesmo à luz da dialética.


Para evitar ficar “melhorando” esse texto por mais vezes, já que não aguento mais, vou me dar por vencida. Não adianta mais mudar o lugar de uma vírgula ou a escolha de um sinônimo mais adequado. Não cabe mais esse tratamento estético por que vai começar a ficar estranho, a gente sabe disso.


Lefebvre escreveu mais de 70 obras, todas elas associadas, então seriam necessárias teses e mais teses para falar das suas perturbações. Convido-os a ler “O direito à cidade”! Boa viagem!



Bibliografia:

LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. 5 ed. 4ª reimpressão. São Paulo: Centauro Editora, 2013.

 
 
 

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Amanda de Almeida

Graduada em Eng. Civil pela Universidade Federal de Campina Grande/UFCG. Mestranda em História/UFCG na área de Patrimônio Histórico e Cultura, Monumento e Memória. Apaixonada por livros, pela rebeldia, pela inovação, pelo espontâneo e pela (des)construção do saber.

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